segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A gestão interfederativa do SUS.


A gestão interfederativa do SUS
Lenir Santos[1]

Desde os anos 90 que a saúde da família constitui uma inovação no nosso país, tendo um importante papel na atenção primária. Todos os municípios brasileiros mantêm esse sistema comunitário de atenção à saúde.

Contudo, sendo o Brasil um país continental – com quase 200 milhões de habitantes e 5.564 municípios dos mais variados portes social-demográfico e cultural, com 70% dos municípios com menos de 10 mil habitantes – a implantação e consolidação da saúde da família vem esbarrando em uma série de dificuldades na sua gestão, dentre elas, a da fixação de médicos no território municipal.

Exatamente em razão da maioria dos municípios brasileiros serem de pequeno porte, a manutenção de médicos e outros profissionais de nível superior tem sido uma barreira para a consolidação da saúde da família no SUS.

Uma série de dificuldades aparece dia a dia na gestão pública municipal, como: concursos desertos; freqüentes pedido de demissão; salários incompatíveis com o teto salarial do prefeito; limite de pessoal imposto pela lei de responsabilidade fiscal; não estabelecimento de vínculo do médico com o paciente, em razão da alta mobilidade dos profissionais de saúde; falta de capacitação de pessoal da equipe de saúde da família em decorrência desta mobilidade, e muitos outros problemas.

Isso tudo tem levado os gestores da saúde a refletirem sobre esse tema, tendo sido aventada pelo Secretario da Saúde da Bahia, em 2007, a criação de uma fundação estadual para gerir a saúde da família nos municípios. Contudo, isso acabou não sendo viável no âmbito da administração pública baiana. Assim, propus ao Secretário a criação de uma fundação intermunicipal, o que parecia um grande desafio. Desafio aceito, a Secretária da Saúde do Estado passou a realizar um amplo trabalho de convencimento dos prefeitos, com 69 municípios sendo hoje os instituidores da Fundação Estatal Saúde da Família – FESF, nascida em 2009.

Concebido o projeto do ponto de vista jurídico, foi necessário resolver alguns impasses jurídicos, como a questão da vinculação da fundação a diversos entes federativos (por ser a mesma criada por uma multiplicidade de entes e não apenas por um). Esse ponto parecia, a princípio, inviabilizar o projeto, quando inseri nos projetos de leis o conselho interfederativo, composto pelos entes instituidores, ao qual a fundação ficaria vinculada para efeito de supervisão, de acordo com o Decreto-lei 200, de 1967. A sede escolhida foi Salvador e a forma de transferências de recursos financeiros, o contrato de gestão.

A lei instituidora prevê, ainda, a hipótese de outros municípios não instituidores poderem aderir aos programas da fundação, mediante contrato. A fundação conta hoje com a adesão de mais de cem municípios.

A Fundação, como um ente do conjunto dos municípios instituidores, tem a finalidade de fazer a gestão compartilhada com os municípios, da saúde da família no Estado: de um lado a fundação, contratando e gerindo o pessoal sob o ponto de vista administrativo; de outro, o município, gerindo sua equipe do ponto de vista técnico: soma de esforços para um fim único. Isso fez surgir a possibilidade de criação de um plano de carreira, emprego e salários para o trabalhador da saúde da família, o qual lhe permita mobilidade dentro de critérios e limites compatíveis com as finalidades da atenção primária.

Além do mais, será possível criar um sistema de escala de compras de insumos para a saúde da família, derrubando preço de produtos e promovendo economia processual. No SUS é preciso inovar, sem desbordar da legalidade. E isso muitas vezes é possível. Basta coragem.

[1] Advogada especializada em Direito da Saúde. Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Sanitário da UNICAMP-IDISA. Coordenadora do IDISA.

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